BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES
⭐⭐⭐⭐⭐
Diário de filmes 2024: 18
Onde ver (em 08/02/2024) – Mídia física: DVD, blu-ray (da Disney). Streaming: Disney Plus. 

Força do pioneirismo

86 anos depois de seu lançamento, Branca de Neve e os Sete Anões enfrentou bem mais que as artimanhas da rainha má: enfrentou a releitura provocada pela mudança da sociedade ao longo dos tempos. Da princesa que canta “Someday my prince will come” ao príncipe que a beija “sem consentimento”, o filme passou a sofrer toda sorte de problematizações (sérias ou de zombaria).

As princesas Disney mudaram muito desde a original, representando esse avançar da sociedade, é claro. De Branca de Neve à Bela de A Bela e a Fera já vai uma grande diferença. Desta a Moana vai mais um salto e por aí vamos. Em 1937, no entanto, o espírito de um conto-de-fadas ainda realmente não estava alinhado ao “Me too” e o beijo do príncipe na princesa pode ter sido sem o consentimento no momento, mas naquela época tinha alguma compensação o detalhe de que, bem, ele a estava trazendo de volta da morte.

Isto posto, Branca de Neve tem qualidades suficientes para pôr o que envelheceu em sua postura meio de lado em favor da maravilha que ele é enquanto filme mesmo. A animação é um assombro ainda nos dias de hoje, com movimentação incrível dos personagens e sequências impressionantes, como a fuga da princesa pela floresta assustadora (que ganha vida aos olhos da moça) e a incrível transformação da rainha em bruxa (chamando a atenção para o plano-sequência em que ela desce a escada em caracol, com sua capa esvoaçante).

A rainha, aliás, tem que estar em qualquer lista séria de maiores vilões do cinema. A dublagem brasileira de 1965, que é a disponível hoje no home vídeo (felizmente a partir daí não mais redublada), acentua sua vilania com seu português formal. “Se não a matares, tu morrerás!”, ela ameaça o caçador.

Os animadores ganhavam uma bonificação por gag criada, então o filme tem muitas gracinhas visuais envolvendo os animais que ajudam a princesa e os sete anões. A riqueza visual dos cenários pode ser vista, por exemplo, nos entalhes com cara de coruja nos degraus da casa do septeto.

Os anões, por si só, apenas por estarem lá, já são alvo de cancelamento hoje. Até o termo “anão” é tema e controvérsia e jamais seria usado no título de um filme atualmente. Se Walt Disney na época teve a ideia de reforçar desde os nomes uma personalidade dominante de cada anão para que o público os diferenciasse rapidamente, hoje pode ser tomado como reducionista: eles devem ser multifacetados, mesmo que isso os torne mais parecidos e, ironicamente, menos individuais.

Enfim, são questões para a refilmagem live action lidar. O filme de 1937 é o que é e, felizmente, é muito mais do que questões que realmente envelheceram ou exageros correcionistas. Com Disney arriscando o pescoço nessa produção, ele criou um marco que ainda deve ser admirado e apreciado. Uma obra-prima do cinema.

BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES. Snow White and the Seven Dwarfs. Estados Unidos, 1937. Direção: David Hand. Vozes na dublagem original: Adriana Caselotti, Lucille La Verne, Roy Atwell. Vozes na dublagem brasileira (de 1965): Maria Alice Barreto, Estelita Bell, Magalhães Graça, Orlando Drummond.