Voando mais alto
Em dez minutos, a Pixar já assina um dos melhores filmes do ano. O início de Up – Altas Aventuras (Up, Estados Unidos, 2009), resumindo toda a história de um profundo amor, é simplesmente sublime e um prólogo muito diferente do que o filme vai apresentar depois. Para muita gente, criou uma expectativa que a animação não cumpre mais à frente, mas, na verdade, é também aí que se justifica o que virá.
Num gênero dominado anteriormente por histórias de princesas e recentemente por animais tentando reencontrar a natureza, além de continuações de sucessos da hora, chega a ser um espanto a originalidade da trama: um velhinho que resolve realizar o sonho da falecida esposa e ir para a América do Sul – levando sua casa inteira, suspensa por balões.
Esse foi o ponto – essa imagem tão irreal quanto encantadora – em que todo mundo se concentrou ao falar sobre o filme, mas Up é muito mais do que isso. Carl Fredricksen (muito bem dublado no Brasil por Chico Anysio), quando criança, era fã de um famoso explorador e isso define os rumos que o filme ganha a seguir: o de uma aventura com ritmo digno de Indiana Jones.
Não por acaso, a história começa nos anos 1930, quando o mundo ainda não era varrido por satélites e grandes explorações alimentavam os sonhos dos aventureiros de espírito. A Amazônia era um desses lugares do qual não se sabia quase nada e às vezes, na ficção, podia revelar desde civilizações antigas ainda desconhecidas pelo homem até o “elo perdido”, um local em que dinossauros conseguiram sobreviver à extinção. É daí que surge o pássaro raro que, logo no começo, é citado na trama.
A inspiração no cinema clássico não pára aí: está também nas inspirações para as imagens de Carl e de Charles Muntz, o explorador de quem ele era fã quando garoto. Carl é a cara de Spencer Tracy e Muntz é Kirk Douglas, dois dos mais queridos atores da história do cinema – da juventude à velhice.
Além dessas, todas as demais idéias são ótimas: a começar pelo escoteiro penetra Russell, de oito anos. Sua animação natural é o contraponto perfeito para a ranhetice de Carl e Up tem o bom senso de não enchê-lo de gírias preferindo retratá-lo de maneira inocente e com um drama familiar mostrado de maneira bem leve (a ponto, até, de sua resolução/ elucidação ficar meio subentendida no fim).
É o caso também dos cachorros falantes. Animais que falam não são, claro, novidade no campo da animação – seja na Disney, seja fora dela. Desta vez, a Pixar resolve que os cachorros falam através de uma maquineta que “traduz” seus pensamentos. Com isso, eles não ficam humanizados demais – outros desenhos combinam as atitudes caninas com outras humanas, com resultado excelentes, diga-se: A Dama e o Vagabundo (1955) e 101 Dálmatas (1961), principalmente.
Todos estes elementos procuram seguir um espírito que é a marca da Pixar: o de tentar cativar as crianças acreditando que é possível fazê-lo com uma obra de qualidade impecável. Que desalentador quando se ouve um “ah, é para crianças” para justificar um filme infantil que fica na piada fácil e nas cores fortes. Up, ao contrário, arrisca muito, com personagens fora dos padrões – que não são, a princípio, “da hora”, “maneiros”.
E é exemplar como tudo está a serviço da história – e é a história de um recomeço, de superação de perdas, de um reencontro consigo mesmo. Up, dirigido por Pete Docter com Bob Peterson como co-diretor, justifica toda sua aventura por aí. Seu lado “Indiana Jones” não está lá só para tornar o filme movimentado. Ao contrário: faz parte do âmago da trama porque diz totalmente respeito ao seu personagem principal.
Neste sentido, o momento em que Carl revê o velho álbum de fotos e recortes da esposa é uma maravilhosa lição. Nem é uma grande revelação, mas não importa – porque esquecemos dela com muita frequência.
Up – Altas Aventuras (Up). Direção: Peter Docter. Vozes na dublagem original: Edward Asner, Christopher Plummer, Jordan Nagai, Bob Peterson, Delroy Lindo. Vozes na dublagem brasileira: Chico Anysio, Nizzo Netto. Atualmente em cartaz nos cinemas.
2 comentários
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02/01/2010 às 14:22
Os melhores filmes de 2009 « Boulevard do Crepúsculo
[…] Os dez primeiros minutos são sublimes. O que se segue no filme de Peter Docter é o amor pelo cinema de aventura e a emoção de recomeçar. A Pixar acertou em cheio de novo. Crítica no Boulevard […]
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29/01/2014 às 19:01
ALDACIRA
NUNCA ASSISTIR ESSE FILME MAIS HOJE VAI PASSAR O UP AVENTURAS COITADA DA MULHER NE PESSOAL PORQUE ELA MORRE A MAIS DEUS QUE PROTEJA ELA MAIS GRAÇAS A DEUS QUE EU ESTOU VIVA KKKK QUEM MANDOU ESSA RESPOSTA SOU EU AALDACIRA DO SANTOS AZEVEDO E GIOVANNA A FILHA DELA
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